No outono, a Islândia veste-se de ouro para uma festa de cores

Islândia pela quarta vez, setembro de 2017

Islândia pela quarta vez. O que me faltava ainda fotografar depois de já ter ido duas vezes no verão e uma no inverno? Tudo, outra vez. Imaginem que vos davam a oportunidade de visitar outro planeta e esse planeta era simplesmente maravilhoso. Quantas vezes lá gostariam de ir? Provavelmente sempre que pudessem. Ir à Islândia é praticamente como visitar outro planeta. Desta vez fui em setembro, no começo do outono, em busca de outras cores.


O meu mundo, na fotografia, são as cores. As texturas, as formas, sombras e luz. Mas, sobretudo as cores. E a Islândia é um paraíso: água em diferentes estados; azul, transparente, quente em erupção ou em forma de gelo; sob a forma de nevoeiro, chuva, glaciares; em cascatas, nuvens que voam baixinho, com muitas formas e tonalidades. Vulcões, tantos vulcões. Verde, muito verde. Terra de tantas cores e também muitos desertos. Extensas praias de areia preta. Muitos quilómetros de lava a fumegar ou coberta de turfa, o musgo verde onde apetece saltar e adormecer. Dias muito longos no verão. Quando penso na Islândia, cabe tudo isto. É uma explosão de natureza, de liberdade. Somos só nós e a natureza imensa e em formas extremas. Um excesso de beleza. Em termos de personalidade, identifico-me bastante com a paisagem agreste, inóspita, mas também imensa e plural da Islândia. 

A primeira viagem foi em 2010 numa expedição fotográfica de 10 dias ao longo da N1, a estrada principal que dá a volta ao país; é o percurso básico e, talvez, suficiente para a maior parte dos turistas. Mas não foi para mim. Em agosto de 2012 voltei para um percurso mais extenso durante duas semanas, passando pelos fiordes a noroeste e a península de Snæfellsnes, bem como a experiência memorável de entrar na câmara magmática de um vulcão. A terceira vez foi apenas pelo sul do país e a península de Snæfellsnes mas em pleno inverno, em fevereiro de 2015, que incluiu duas expedições a cavernas de gelo. Quem visita este país no verão não percebe porque é que quase não há florestas e árvores neste país. Mas a falta de luz, as tempestades de neve, ventos fortes e o gelo do inverno tornam praticamente impossível a existência de vida vegetal de grande porte. Além disso, os terrenos são bastante áridos e rochosos, com lava.

É sempre uma felicidade enorme planear o regresso a este país. Posso ir lá vezes sem conta que a emoção e o entusiasmo de regressar é sempre superior ao da primeira vez. Para quem gosta de natureza e fotografia, a Islândia é um dos países mais incríveis, com tantos cenários idílicos e paisagens muito diversificadas. Em muitos lugares parece mesmo que estamos noutro planeta. 

O outono e as cores douradas da vegetação em Myvatn e Húsafell

A vegetação rasteira na região do lago Myvatn, no norte da Islândia, e a floresta de Húsafell perto do Langjokull, o segundo maior glaciar do país, foram as duas regiões que mais me surpreenderam no outono. A paisagem veste-se de gala em dourados, onde vários tons de amarelo, laranja e vermelho nos parecem fazer crer que estamos num reino encantado. O outono oferece assim uma palete de cores muito diferentes das paisagens brancas do inverno e das paisagens verdes do verão. Para mim, é mesmo a altura mais fotogénica do ano! Além disso, à noite são as auroram que espreitam e oferecem outras paletes de cores. O outono é, por isso, um festim para os fotógrafos!

A cabana do Hotel Húsafell foi o alojamento mais caro desta viagem, mas também um dos locais mais surpreendentes onde já fiquei. Inserida numa floresta que, nesta altura, estava pintada de tons alaranjados e vermelhos. Nas traseiras da cabana, um trilho para o rio. Podia viver aqui para sempre!

E nesta quarta viagem o que é que fui procurar? Cores, outras cores. A cor dourada da vegetação rasteira no outono; as cores das auroras boreais que regressam em setembro, por vezes mais visíveis do que em pleno inverno, devido às tempestades e ao céu encoberto durante semanas; as cores do gelo, variando entre brancos e vários tons de azul, em dois glaciares; e muitas cores da terra vulcânica nas montanhas de Landmannalaugar, no interior da Islândia.   

Na opinião de alguns fotógrafos, o mês de setembro é o mais fotogénico. E eu pude confirmar. Aliás, é já o meu mês preferido para visitar este país, com a vantagem de que há menos turistas a perturbar a tranquilidade da paisagem. Esta minha quarta viagem durou quinze dias e percorri, não apenas a estrada que circunda a ilha, mas também muitas incursões pelo interior do país. A primeira delas ocorreu logo no segundo dia: uma expedição sobre quatro rodas até às montanhas coloridas de Landmannalaugar. Juntei-me à expedição da Extreme Iceland num jipe de rodas gigantes e passamos também pelo vulcão Hekla, um dos mais ativos da Islândia. Recomendo, mas soube a pouco. Este é um dos lugares onde quero voltar e ter mais tempo para percorrer outras montanhas.

Landmannalaugar: as montanhas coloridas e um vale de lava com musgo e algodão

Montanhas coloridas, pintadas de vários tons, e no meio um vale com lava e musgo e noutras zonas com algodão do campo. Muitos caminhos e percursos. O cenário parece irreal, e uma fonte inesgotável para a fotografia. Chegar até estas montanhas não é fácil: recomendável em grupo e imprescindível um veículo adequado. Não pensem que um 4x4 é suficiente. As estradas são muito duras e repletas de lava solidificada, que pode danificar seriamente alguns carros. Infelizmente há muitos turistas que levam os seus jipes alugados para estas estradas e depois têm surpresas bem desagradáveis...

Um longo dia entre o sul e o norte

A travessia do sul para o norte (entre Jokulsarlon e Myvatn) são cerca de 500 kms de estrada, uma viagem que vai levar um dia. A paisagem é arrebatadora, intacta, sem vivalma nem qualquer localidade durante centenas de quilómetros, mas pode parar para algumas pausas. Ao longo desse trajeto vai ver a paisagem mudar... e a temperatura também. Curiosamente, o norte (em Myvatn) é mais quente, devido à forte atividade geotérmica. Veja o mapa

Alojamento peculiar, mas reservado com antecedência

O planeamento desta quarta viagem começou praticamente um ano antes, quando ficou definido o regresso à Islândia. Ao longo do ano fui anotando num caderno as fotografias que pretendia fazer; fui apontando todas as ideias e perspetivas que me ocorreram para que, quando chegasse aos lugares, nenhuma fotografia ficasse por fazer (como se isso fosse possível). 

Em fevereiro, com sete meses de antecedência, foram comprados os voos de modo a conseguir um preço mais em conta. Nos meses seguintes dediquei-me à reserva dos hotéis e dos programas. Outra das coisas extraordinárias na Islândia são os hotéis. Com a explosão do turismo que se verificou nos últimos anos, têm surgido muitos hotéis fora de Reykjavik bastante peculiares e modernos, mas também muito caros e os preços têm aumentado nos últimos anos em consequência deste crescimento e da recuperação económica. No entanto alguns deles são experiências a não perder, como o Ion Adventure Hotel, onde já tinha ficado duas noites em 2015. Outro alojamento obrigatório é o recente Hotel Húsafell, ideal para quem visitar o glaciar Langjökull (por exemplo, através do tour Into the Glacier). Desta vez, passei uma noite em cada um deles. As recentes e modernas cabanas de Arnarstapi são também obrigatórias, muito próximas do vulcão Snæfellsjökull, que inspirou Júlio Verne na obra "Viagem ao Centro da Terra". 

Fiquei duas noites nas cabanas de Arnarstapi, na península de Snæfellsnes. Um alojamento muito confortável e ainda recente, pois tinha aberto há poucos meses. Ainda cheirava a madeira nova. A poucos quilómetros fica o vulcão Snæfellsjökull, que serviu de inspiração a Júlio Verne e um dos símbolos da Islândia.

O Ion Adventure Hotel é um hotel obrigatório, nem que seja apenas para uma noite, já que não é especialmente barato e fica distante de tudo. O bar em vidro foi especialmente concebido para permitir ver as auroras boreais... se o tempo assim o permitir, claro! Não foi o caso desta noite.

Gljúfrabúi, a cascata secreta

As cascatas são algumas das maiores atrações naturais da Islândia. E são muitas! Seljalandsfoss e Skógafoss são as mais conhecidas do sul. Gljúfrabúi é uma cascata mais recantada (foto ao lado) a poucos metros de Seljalandsfoss. Fica escondida, pelo que poderá passar despercebida se não souber da sua existência. É necessário entrar numa espécie de gruta e caminhar sobre as pedras na água. 

O vale Thórsmörk; o canyon Fjaðrárgljúfur; Seljavallalaug, a primeira piscina da Islândia; o lago Myvatn e Grjotagja, a cave de água quente; Silfra, a falha que separa as placas tectónicas americana e euro-asiática. Foram outros dos locais por onde passei nesta quarta viagem.

Mas é praticamente impossível ir à Islândia sem fazer alguma actividade no gelo. Desta vez, fui até ao Langjökull, o segundo maior glaciar do país, perto de Húsafell, para entrar nas grutas escavadas e fazer o Into The Glacier Tour

O drone permitiu-me fotografar o gelo noutras perspetivas, especialmente em Jokulsarlon, o lago do Vatnajokull, o maior glaciar da Islândia. 

Fotografar com drone

Gadgets novos é sinónimo de novas possibilidades fotográficas. Foi a primeira ida à Islândia em que levei o drone, o que aumentou as perspetivas fotográficas. A ideia de fotografar do céu cedo me cativou, pois está praticamente tudo por registar. E, ao contrário de Portugal, não é preciso pedir autorização a nenhuma entidade militar para fotografar com drone ou publicar as fotografias. Apenas os cuidados sensatos: não ultrapassar os 130 metros de altura, não voar perto de multidões e distante dos aeroportos. Ora, a Islândia é sobretudo natureza, são poucas as localidades, pelo que é um paraíso para a fotografia aérea. Com uma condicionante: o mau tempo. A chuva e o vento podem dificultar os voos. Mas consegui colocar o drone a voar no lago de gelo em Jokulsarlon, em entradas do glaciar Vatnajokull, junto à praia e montanhas de Stokksnes, no lago Myvatn e cratera do vulcão Hverfjall.

As cores do céu: do arco-íris às auroras boreais

Na Islândia até o céu é uma fonte inesgotável de surpresas. Durante o dia são as nuvens que voam baixinho e o arco-íris que se cruza no nosso caminho várias vezes ao longo do dia.
À noite, são as luzes dançantes...

As luzes do norte, mais conhecidas por auroras boreais, são um dos fenómenos naturais mais espetaculares no hemisfério norte do globo. Só podem ser observadas entre finais de agosto e abril, ou seja, quando há noite escura. No mês de setembro, como ainda há muitos dias de céu limpo, as noites podem ser bastante coloridas. É só preciso um pouco de paciência (algumas horas ao relento, longe das cidades), o tripé é fundamental pois trata-se de uma longa exposição e boa proteção contra o frio. E convém ver as previsões das condições geomagnéticas antes de sair de casa. Há várias aplicações e sites que fornecem essa informação.

Os fotógrafos têm tido um papel fundamental no crescimento do turismo neste país. Depois da crise financeira de 2008, que levou a uma desvalorização da moeda; da erupção do vulcão Eyjafjallajökull, que colocou todas as atenções nesta pequena ilha; dos muitos filmes e séries que têm sido filmados neste país, como A Guerra dos Tronos, A Vida Secreta de Walter Mitty, Noé ou Prometheus, que divulgam estas paisagens, umas bucólicas outras quase irreais, por todos os cantos do globo; também os milhares de fotógrafos têm ajudado a promover o país. 

Uma década depois da crise financeira que obrigou os islandeses a procurar novas fontes de rendimento, a Islândia está novamente a crescer e mantém os indicadores de desenvolvimento humano nos lugares cimeiros do mundo. A população é relativamente pequena, com pouco mais de 300 mil habitantes, mas regista um elevado nível de instrução: mais de 90% da população tem formação superior. Além disso, é um dos países mais seguros do mundo, com as mais baixas taxas de criminalidade e corrupção. Impossível não admirar um país assim. 

E se acham que está tudo visto, enganam-se. Já estou a sonhar com a quinta viagem!


Sugestões: livros, música e roupa

O que é que eu costumo trazer da Islândia, além das fotografias, da memória repleta de imagens e novas sensações, do cansaço de muitos quilómetros percorridos a pé e de carro, do brilho nos olhos e da alma revigorada? Livros, muita música e alguma roupa. Ainda antes de partir para a Islândia pode ler "Gente Independente" do Nobel Halldór Laxness. Na música, Bjork e Sigur Rós já não são os únicos embaixadores do país; em Reykjavik, visite a 12 Tónar e procure a música de Ólafur Arnalds, Ásgeir, Of Monsters And Men e o recém desaparecido Jóhann Jóhannsson. Como a fotografia é uma arte bem apreciada na Islândia, há alguns livros de fotografia que se tornaram best sellers: Lost in Iceland e Iceland Small World, ambos do fotógrafo Sigurgeir Sigurjónsson. E na roupa, tem mesmo que entrar nas lojas da 66North; é cara, mas quentinha e vai agradecer durante a viagem; pelo menos um gorro vai querer trazer.

Pode ver os meus apontamentos fotográficos desta viagem na minha página de Instagram, através do hashtag #islandiapelaquartavez

Durante meses programei todos os detalhes da viagem. Há sempre imprevistos, mas o planeamento reduz o desperdício de tempo.

Com este monstro de 4 rodas gigantes da Extreme Iceland fiz a expedição até Landmannalaugar. Às 9 da manhã em ponto estava na porta do hotel.

Em Reykjavik, passe pela 12 Tónar, a loja de música mais conhecida da cidade, e abasteça-se de música para os milhares de quilómetros de estrada.

A N1, estrada que circunda o país, é uma das estradas mais fotogénicas do mundo, marcada pela tranquilidade e pelas ovelhas ao longo do percurso.

Com o aumento do turismo, este é o cenário habitual junto de atrações naturais. Aqui os fotógrafos registam uma das cascatas ao fim da tarde

Baleia fermentada ou cabeça de carneiro cozida são algumas das iguarias gastronómicas. Prefiro o Skyr! Também recomendo a sopa de cordeiro.

Esta minha viagem à Islândia pela quarta vez foi o tema do artigo "A paisagem viciante da Islândia" de Luís Octávio Costa, no Fugas, do jornal Público.


Quer ir à Islândia no outono?
Espreite o programa de 12 dias que criei para a edição de lançamento da PROTESTE Viagens.

Depois de quatro viagens a este país no meu currículo, fui desafiado a criar um programa de sonho para uma viagem à Islândia. Além de muitas dicas e sugestões de atividades, encontram um programa definido ao milímetro para o mínimo de 12 dias, no começo do outono. A você cabe apenas marcar a data na agenda e tratar das reservas.

Descarregue aqui a edição de lançamento da PROTESTE Viagens


 

ⓒ O Viajante Aprendiz - Portfólio fotográfico de António José Ribeiro